O Tempo
Há duas formas de marcar o tempo.
Uma delas foi inventada por homens que amam a precisão dos números,
matemáticos, astrônomos, cientistas, técnicos. Para marcar o tempo de forma
precisa, eles fabricam ampulhetas, relógios, cronômetros, calendários. Nesses
artefatos técnicos, todos os pedaços do tempo - segundos, minutos, dias, anos –
são feitos de uma mesma substância: números, entidades matemáticas. Não há
inícios nem fins, apenas a indiferente sucessão de momentos, que nada dizem
sobre alegrias e sofrimentos. Apenas um bolso vazio. Nele, a alma não encontra
morada.
Nas Olimpíadas, a performance dos
corredores e nadadores é medida até os centésimos. Fico me perguntar: “Como é
que conseguem? Que diferença faz?”.
A outra foi inventada por homens
que sabem que a vida não pode ser medida com calendários e relógios. A vida só
pode ser marcada com a vida. Os amantes do Cântico do Cânticos marcavam o tempo
do amor pelos frutos maduros que pendiam das árvores. Quando as folhas dos
plátanos ficam amarelas sabemos que o outono chegou. Os ipês-rosas e amarelos
anunciam o inverno.
Qual a magia que informa os ipês,
todos eles, em lugares muito diferentes, que é hora de perder as folhas e
florescer? E sem misturar as cores. Primeiro os rosas, depois os amarelos e,
finalmente, os brancos.
Viver ao ritmo de alegrias e
tristezas é ser sábio. “Sapio”, no latim, quer dizer, “eu saboreio”. O sábio é
um degustador da vida. A vida não é para ser medida. Ela é para ser saboreada.
Um texto Bíblico diz: “Ensina-nos
a contar os nossos dias de tal maneira que alcancemos um coração sábio.
Autor: Rubem Alves
Livro: Do Universo da Jaboticaba

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