Nada é mais profundo do que uma pessoa com os olhos vidrados de culpa
Antes de tudo, a ignorância típica do politicamente correto salta aos olhos porque a culpa não é um fenômeno ocidental, e mesmo o darwinismo aponta a culpa (vergonha e mal-estar moral) como um dos centros afetivos da vida moral do bando de caçadores-coletores, célula máter ancestral de nos vida social.
Nada é mais profundo do que uma pessoa com os olhos vidrados de culpa. Pessoas sem culpa são monstros morais. O discurso segundo o qual a culpa é uma forma pensada de controle dos mais fortes sobre os mais fracos (em que pese o fato de que a culpa pode mesmo ser manipulada, como tudo mais que é verdadeiro na vida humana) é falso e indica antes de tudo uma mentalidade infantil, na medida em que se sentir culpado é um dos modos mais típicos da consciência moral.
em assuntos como esses, melhor do que a argumentação pura e simples é a experiência. Você, caro leitor, já fez mal a alguém? Alguém que não merecia? Se a resposta for não, você é um mentiroso.
Livro: Guia Politicamente incorreto da Filosofia
Autor: Luiz Felipe Pondé
Platão e o famoso mito da caverna
Em A República, Platão, como porta-voz de Sócrates, descreve a famosa alegoria que ilustra o caminho dos homens rumo à verdade, à justiça e ao bem.
Platão nasceu em uma família aristocrata de Atenas. Na juventude, tornou-se discípulo de Sócrates, aderindo ao método filosófico por ele utilizado – a busca da verdade por meio de diálogos investigativos – e, mais tarde, sistematizando por escrito os pensamentos do mestre. “Sócrates é um dos poucos filósofos que nunca escreveu nada, porque se dedicava basicamente ao exercício da dialética. Por ter registrado o que disse o seu mestre é que Platão tornou-se a grande referência do pensamento clássico”, afirma Neusa Maria Pitta de Souza, professora de Filosofia do Curso Elite Curitiba e do Colégio Marista Santa Maria. Entre as obras deixadas por Platão, uma das mais conhecidas e estudadas é A República, na qual ele discute a criação de um Estado ideal. O texto é extenso e está dividido em dez livros, mas apenas o sétimo será cobrado no vestibular da UFPR.
Neusa explica que a obra foi escrita no século 4º a.C., num contexto de desilusão de Platão com o sistema político ateniense e com o fim trágico de Sócrates, condenado à morte sob as acusações de corromper a mente dos jovens e não acreditar nos deuses. “A tônica de A República é a idéia de que só por meio da educação é possível estar preparado para exercer o poder político a favor do coletivo, e não de interesses pessoais”, sintetiza. Segundo a professora, o texto traz a transcrição de conversas ocorridas principalmente entre Glauco (irmão de Platão) e seu mestre, Sócrates, que propõe a criação de um governo comandado por filósofos ou cidadãos com formação filosófica. De acordo com ele, esses indivíduos seriam os mais próximos da verdade, da justiça e da ideia do bem.
No livro sétimo, Sócrates utiliza uma alegoria para ilustrar a trajetória que tira o homem da ignorância e o leva ao conhecimento verdadeiro. O filósofo compara a realidade da sociedade da época com a situação de um grupo de pessoas que viviam na escuridão de uma caverna, presas por correntes e de costas para a entrada, de modo que a única coisa que conseguiam ver eram as sombras do mundo exterior projetadas na parede em frente. Sem a consciência do que se passava fora dali, tomavam por reais aquelas figuras. “Essas pessoas simbolizariam a Atenas da Antigüidade, com sua existência dominada pela ignorância”, compara Neusa.
Um dia, porém, um daqueles prisioneiros se liberta e deixa a caverna. Chegando ao lado de fora, ele nada enxerga, pois seus olhos, habituados à escuridão, são ofuscados pela luminosidade do sol. Aos poucos, entretanto, vai recuperando a visão e desvendando sombras, imagens refletidas na água e, finalmente, a infinidade de objetos e seres ao seu redor. Ainda admirado, se depara com a existência de um outro mundo, totalmente diferente do subterrâneo em que fora criado.
Nessa passagem, afirma Neusa, Platão pretende mostrar que é sempre difícil chegar ao conhecimento verdadeiro, sendo preciso percorrer caminhos árduos para alcançá-lo. A alegoria sugere ainda que cabe ao mestre somente apontar esses caminhos, pois a trajetória a ser percorrida é individual. “Esse homem que rompe as amarras que o prendem sai de uma zona de conforto, tendo de fazer muito esforço físico e criar estratégias intelectuais para conseguir sair da caverna. E quando ele se dá conta de que passou a vida inteira vendo meros reflexos, fica absolutamente indignado e extasiado, e sente uma necessidade enorme de voltar ao fundo da caverna para contar aos seus companheiros o que descobriu”, explica, dizendo que o retorno ao abrigo pode ser comparado à postura dos professores, cujo papel é estimular o processo reflexivo.
Para Platão, entretanto, o processo de retorno à caverna também seria doloroso, pois o homem que descobriu as maravilhas do mundo exterior acabaria ridicularizado e hostilizado pelos que se encontravam aprisionados. Dessa forma, afirma a professora, o autor expõe o desconforto do homem sábio quando é obrigado a conviver com as pessoas comuns, preocupadas apenas com seus problemas cotidianos e interesses pessoais. Ela explica que para Sócrates e Platão existem dois mundos: o visível e o inteligível. O primeiro é aquele ao qual a maioria da humanidade está presa, crendo, iludida, que as sombras são a realidade. O outro é o reino da inteligência, privilégio daqueles que encontraram a essência do bem e do belo.
Autora: Marcela Campos
A insanidade da mente contemporânea
Jair buzina para o carro logo à frente de seu Ford, pois a sinaleira abriu; mas Jair se irrita quando alguém, na próxima sinaleira, buzina para ele pelo mesmo motivo. Jair fica irritado por esperar na fila do supermercado até que a velhinha encontre uns trocados na bolsa diante do caixa; mas acha injusto que se animem contra ele. Jair costuma dar umas olhadelas quando a moça bonita passa com a saia curta; mas Jair considera traição que sua esposa suspire para o carteiro bonitão.
Nada se resolve de fato nesta caminhada de Jair, neste quesito, e isso é parte da questão, parte da "loucura" que Jair justifica como "normal no mundo corrido de hoje". Parte da normalidade "louca" de nossa época parece consistir em presumir o outro, em vez de promover a alteridade.
Camel anseia por férias, solicita em requerimento que possa antecipá- la; quando, por fim, consegue, vai para a praia e fica a jogar cartas: "Para matar o tempo". Assim, o tempo passa rápido em suas férias e logo ele estará novamente no enfadonho trabalho; poderá iniciar então novas reivindicações por férias. Eterna insatisfação. Camel fica confuso com este tipo de "loucura". Um dos modos pelos quais isso ocorre é quando uma pessoa não associa atos em sequência, dissocia os elementos. Epimênides provavelmente nasceu em Cnossos, na ilha de Creta. Muito do que se conta sobre ele notoriamente não aconteceu, mas as histórias são interessantes ainda hoje. Epimênides afirmou que os de Creta mentiam, todos eles. Bem, como ele era de Cnossos, em Creta, então ele também mentia, segundo suas próprias palavras. Mas, em tal caso, a afirmação dele seria verdadeira? Ele disse que todos os cretenses mentiam; ele era cretense, também mentia; estaria mentindo ou nos dizendo uma verdade? Em quaisquer da situações, estamos com problemas. Muitos casos de "loucura" de gente "normal" dizem respeito a elementos de desentendimentos, incompreensões, coisas que a linguagem aceita e que estão dissociadas da vida. Exemplo: "Vou te dar a ordem de não aceitares ordem nenhuma". Ora, e esta ordem que foi passada deve ser aceita?!
Uma das mais contundentes "loucuras" de gentes "normais" dos nossos dias está relacionada aos códigos de alienação. Reich explanou o tema: "Não existe nada a que mais fujas do que a encarar-te a ti próprio. Estás doente, Zé Ninguém, embora a culpa não seja tua. Mas é a ti que cabe libertares-te da tua doença. Já há muito que terias derrubado os teus verdadeiros opressores se não tolerasses a opressão e não a apoiasses tu próprio". Erich Fromm escreveu: "As pessoas são transformadas em coisas; suas relações umas com as outras assumem o caráter de propriedade. Mas a questão essencial não é tanto o que seja o conteúdo do eu, senão que o eu seja sentido como uma coisa que cada um possui, e que essa 'coisa' seja a base de nosso sentido de identidade". Aqueles que se consideram "normais", que entendem ser adequados ao mundo o suficiente para poderem dizer quem é "louco" e quem não é, isso a partir do entendimento que possuem sobre saúde mental, logo eles (!), não percebem que é um sintoma da insanidade que condenam o estudo que fazem, a identificação e o tratamento da "loucura" daqueles a quem consideram insanos. Parte da alienação de si mesmos.
Pede paz e fabrica armas de guerra. Pede amor e oferece desconfiança, medo. Fala em liberdade e constrói prisões. Prega a fraternidade e usa de fofoca e intrigas. Afirma a saúde enquanto ergue usinas para adoecer pessoas. Este que assim procede foi quem instituiu o que se chama de "loucura"? E o fez para si mesmo? Não, fez para os outros. sintomaticamente. Não compreendendo que as impressões dolorosas e desencontradas que vivem se desencadeiam a partir de compreensões tortas, muitos olham para o outro na forma de espelho. Joey está muito "doente", segundo os próprios padrões que utiliza para designar quando alguém está seriamente enfermo. Levanta cedo, geralmente ansioso, receoso, sabendo que precisa se colocar em movimento. Chove, e ele lamenta; assim como lamenta, por outros motivos, quando faz sol. Sempre há um problema fustigando a mente de Joey, com pausas de alívio, as quais ele compreende como efêmera paz.
Joey tem pressa para fazer as coisas, mas não entende o motivo. Não gosta de esperar. Magoa-se facilmente, mas dificilmente entende por que as pessoas se ferem tão facilmente. Violento e temperamental, Joey afirma que apenas usa isso como defesa, que é um ser pacífico. não percebe sua contradição. Joey quer mais. mais dinheiro, mais amor, mais sexo, mais tempo, mais compreensão, ainda que desperdice o pouco que possui de tais elementos; ainda que tivesse o que deseja provavelmente colocaria tudo a perder. Joey ouviu uma música, de Jackson Browne, chamada "Running on Empty". Joey ficou muito triste. A música diz: "Em 1965 eu tinha 17 anos e corria pela estrada; não sei bem para onde eu corro agora, apenas continuo correndo". Joey em breve vai se aposentar. Conta que realizará então as coisas que não conseguiu fazer porque esteve trabalhando a vida inteira. Mas Joey não tem mais sonhos, está muito cansado, diabético, hipertenso. As coisas perderam o sentido há muito tempo.
Joey se esqueceu das perguntas, das respostas. Mas serve de alento que agora falta pouco. Em breve tudo terminará, não é, Joey?
Por Lúcio Packter
Max Weber
Max
Weber começou a sua carreira intelectual no campo do direito e suas primeiras
atenções concentram-se no estudo da história das instituições jurídicas. Ao
longo de sua carreira docente, Weber foi essencialmente um professo de
economia. No entanto, sua abordagem nunca isolou os fenômenos jurídicos e
econômicos de sua dimensão social, vindo daí seu interesse e seu investimento
na reflexão sociológica. Nesta medida, Weber, jurista de formação e economista
por profissão, foi se tornando, paulatinamente, um sociólogo por confissão.
Ao
contrário de Comte e Durkeim que construíram suas teorias sociológicas com base
no primado do objeto, Weber vai orientar toda sua produção sociológica com base
no primado do sujeito. A idéia de que o indivíduo é o elemento fundante na
explicação da realidade social atravessa a produção epistemológica e
metodológica do autor, operando uma verdadeira revolução nas ciências sociais.
Deste modo, Weber inaugurou na sociologia um novo caminho de interpretação da
realidade social: a teoria sociológica compreensiva.
Se
para Durkeim a sociedade é o fundamento lógico da sociologia; para Weber este
fundamento reside no indivíduo. Essa afirmação vai muito além do fato de que
uma sociedade não existe sem as pessoas. A constituição da sociedade somente se
realiza pela ação e interação recíprocas entre os agentes sociais. Então, quer
dizer que a “sociedade”, ou mesmo estruturas coletivas como a família, o grupo,
o Estado, o capitalismo e outros, não existem? Não se trata exatamente deste
argumento. Conforme explica Cohn (1991, p. 26), o que Weber quer dizer é que,
de fato:
O
objeto de análise sociológica não pode ser definido como a sociedade, ou o
grupo social, ou mediante qualquer outro conceito de referência coletiva. No
entanto, é claro que a sociologia trata de fenômenos coletivos, cuja existência
não ocorreria a Weber negar. O que ele sustenta é que o ponto de partida da
análise sociológica só pode ser dado pela ação de indivíduos e que ela é
“individualista” quanto ao método.
Em
Weber, a possibilidade de entender a sociedade e suas instituições passa pela
análise do comportamento dos indivíduos. Tudo o que existe na sociedade, seus
grupos, instituições e comportamentos são expressões e objetivações da
atividade dos homens que lhes dá seu sentido e seu significado. É por esta
razão que o individuo é o fundamento da explicação sociológica.
Livro: Sociologia Clássica
Autor: Carlos Eduardo Sell
Alienação
A alienação idéia criada por
Feurback significa que a “exteriorização” e objetivação dos bens sociais que
resultaram do processo de trabalho tornam-se autônomos e independentes do
homem, apresentando-se como realidades “estranhas” e opostas a ele, como um ser
alheio que o domina. O trabalho inverte seu papel e, de meio para a realização
do indivíduo como ser humano, passa a negar e impedir o desenvolvimento de sua
natureza. É neste sentido que o capitalismo aliena o homem de sua própria
essência quer é o trabalho. O capitalismo, e seu fundamento, a realidade
privada, seria a causa desta inversão. De acordo com as idéias contidas neste
texto, a alienação humana ocorre segundo diferentes processos e dimensões.
- Alienação do produto do seu próprio trabalho: aquilo que o trabalhador produz no capitalismo não pertence a ele. Pertence ao proprietário capitalista, ao dono dos meios de produção. Aqui o homem aliena, sou seja, perde o controle daquilo que ele mesmo produz, que dizer, o objeto de trabalho.
- Alienação do processo de produção: na economia capitalista, o trabalhador também não controla a atividade de produzir. Esta capacidade é vendida por ele ao proprietário. No processo de produção o trabalhador também aliena sua atividade. Ela não lhe pertence e é controlada por outra pessoa.
- Alienação de sua própria natureza humana: a principal conseqüência da propriedade privada e do capitalismo é que o homem está alienado de si mesmo, ou seja, de sua natureza como ser humano, de seu ser genérico. Isto acontece porque o trabalho - que é o elemento que o diferencia das outras espécies – não está mais a serviço da hominização e humanização. A realidade se inverte. O trabalho não está a serviço do homem, pois ambos estão submetidos à lógica do capital.
- Alienação do homem de sua própria espécie: a alienação atinge a relação dos homens entre si, pois, na forma capitalista, as relações passam a ser mediadas e controladas pelo capital, seja pela relação empregador e empregado, seja pela mercantilização das demais relações sociais. O homem está alienado de seus semelhantes.
Livro: Sociologia Clássica
Autor: Carlos Eduardo Sell
Nietzsche se dirige mais aos
assim chamados cristãos do que propriamente a Cristo, por que então o livro se
intitula “O anticristo”, ou seja, “o adversário de Cristo” (num alusão a uma
passagem do Apocalipse)? É verdade que o subtítulo já torna as coisas mais
claras, mas a explicação de uma peculiaridade do termo alemão esclarece-as
plenamente: é que, em alemão, Antichrist pode significar tanto “anticristo”
quanto “anticristão”.
Porém, anticristo ou anticristão
(ou ainda, em medidas diferentes, as duas coisas), um fato permanece: o caráter
essencialmente negativo, combativo do texto. Mas essa combatividade, é
importante notar, não exclui um profundo sentimento afirmativo: “o mundo é
perfeito”, diz Zaratustra, “o mundo é perfeito”, dizem também os sábios hindus
que instituíram o Código de Manu. E essa perfeição não exclui sequer as
criaturas mais desprezíveis, os parias – ou, no caso de Nietzsche, os
cristãos... Possuir inimigos é uma felicidade: se Nietzsche, ao publicar a
primeira de suas Considerações extemporâneas, entra na sociedade com um duelo
(seguindo uma máxima de Stendhal, conforme reconhece em sua autobiografia),
pode-se afirmar o mesmo de suas últimas obras, de sua saída da sociedade, por
assim dizer. Daquela vez, Nietzsche desmascarou o “filisteu da cultura” na
pessoa do escritor David Strauss; desta vez, toda uma visão religiosa de mundo.
Na condição, poderíamos dizer, de
um iluminista sem as ilusões do iluminismo (que se atente para o desdém com que
o autor encara as idéias de progresso e de igualitarismo que estão na base da
modernidade), Nietzsche nos oferece assim a possibilidade de exercitar aquela
que talvez seja uma das maiores tarefas do fazer filosófico, a de indagar pelas
razões, pelos porquês de interpretações oferecidas muitas vezes como verdades
absolutas, algo fundamental numa época em que o mercado de crenças religiosas
experimenta novas expansões a cada dia.
Se, por um lado, parece correto o diagnóstico de Nietzsche acerca da morte do
deus cristão (tal como apresentado nas obras A gaia ciência e Assim falou Zaratustra), não parece menos certo,
por outro, que esse deus insiste em “ressuscitar no tereceiro dia” – razão pela
qual a afiada crítica de Nietzsche, mais de um século depois de sua publicação,
ainda não perdeu sua razão de ser.
Livro: O anticristo
Autor: F. Nietzsche
O elogio da Loucura
Erasmo Desidério, ou Erasmo de
Rotterdam, como ficou conhecido devido ao seu local de nascimento, ou, ainda,
Voltaire Latino, apelido que lhe foi dado em virtude de suas críticas à Igreja
Católica, é uma figura central para se entender as transformações pelas quais
passou à época moderna.
Nasceu em meados do século XV,
como fruto da ligação ilícita entre um padre e uma moça, e recebeu uma forte
educação religiosa e latinista.
A sua obra mais importante do
ponto de vista teológico é Colóquios. Mas
é em Elogio da Loucura, escrita em 1501, que Erasmo chega às raias com sua veia
satírica, recheando de humor os absurdos da filosofia, da fé e, mais
universalmente, do comportamento humano – sendo, deste modo, totalmente
acessível ao leitor leigo. O texto foi escrito na Inglaterra, na casa do
pensador Thomas Moore (que, não por acaso, verteu seu pacifismo na obra Utopia,
na qual esboçava uma sociedade na qual todas nações e todos os homens viveriam
em paz). Quem fala, em Elogio da Loucura, é a própria Loucura. A insanidade
demonstra como está presente na vida dos homens e tudo o que estes a ela devem,
pois é ela, a Loucura, e ninguém mais, que move o mundo. O que, na verdade, o
humanista Erasmo faz é nos convidar a observar – com humor e compaixão, além de
identificação – a natureza humana e sua franquezas, de modo a nos adaptarmos
racionalmente a ela. Nas suas inúmeras referências a divindades antigas, o que
se vê é uma estocada ao pensamento ortodoxo católico; quando escreve “A verdadeira prudência consiste, já que
somos humanos, em não querer ser mais sábios do que nossa natureza o permite”, Erasmo
fala aos seus pares filósofos e teólogos que deixavam que a obsessão pela
verdade única e incontentável cegasse-lhes os olhos frente à realidade complexa.
Em 1542, seis anos após sua
morte, aquela que era um do intelectuais mais célebres e respeitados da sua
época, o astro em torno do qual gravitava tudo o que a Europa contava de
melhor, é decretado pelos teólogos da Sorbonne como “louco, insensato, injurioso
a Deus. Erasmo acabou por ser visto como a ave que incubou o ovo do qual saiu a
Reforma.
Livro: Elogio da
Loucura.
Ecce Homo
Nietzche escreveu, ele mesmo, a melhor obra para entender a obra de Nietzche. é o Ecce Homo, sua autobiografia escrita aos quarenta e quatro anos, o último suspiro antes do declínio, um dos mais belos livros da história da literofilosofia universal.
Ecce Homo. De como a gente se torna o que a gente é é a mais poética - e a mais grandiosa - dentre as obras dedicadas ao egocentrismo humano, a mais singular entre as autobiografias que o mundo um dia conheceu. Gerada no limiar - inclusive temporal - entre a razão e a loucura, Ecce Homo está longe de ser apenas o produto da insânia, inclusive porque - conforme Freud - preserva o domínio da forma. Além da referência crística do título - Ecce Homo -, há a citação pindárica do subtítulo - Como a gente se torna o que a gente é. "O tornar-te aquilo que tu és" de Pídaro fascinou Nietzsche desde os tempos de colegial serviu de epígrafe a um de seus primeiros trabalhos filosóficos, foi usado em diversas ocasiões e virou subtítulo de sua obre mais íntima, o Ecce homo.
Antes de escrever a obra em prosa, Nietzsche escreveu o "Ecce homo" em versos. Ele faz parte de "Chiste, manha e vingança - Prelúdio em rimas alemãs", a maravilha que introduz a Gaia cie^ncia e declara:
Ecce homo
Sim! eu sei muito bem de onde venho!
Insaciável como a chama no lenho
Eu me inflamo e me consumo.
Tudo que eu toco vira luz,
Tudo que eu deixo, carvão e fumo.
Chama eu sou, sem dúvida.
Nos versos desse poema, Nietzsche resume sua filosofia, mostrando que ousa e arrisca, mandando a humilde às favas. "Ecce homo", o poema, antecipa Ecce homo, a autobiografia definitiva do autor. "De tudo aquilo que é escrito, me faz gosto de fato apenas aquilo que alguém escreve com sangue. Escreva com sangue e haverás de experimentar que sangue é espírito", disse Nietzsche em outro de seu aforismos. Ecce homo é uma obra em sangue, que fez seu primeiro exercício autobiográfico já aos quatorze anos - com o opúsculo intitulado "Da minha vida" - e jamais deixou de se exprimir autobiograficamente, de buscar em sua própria vida a matéria-prima para sua obra. Ou alguém é capaz de ler o Zaratustra sem pensar na biografia de Nietzsche? Ou por acaso muitos dos aforismos de Nietzsche não são confissões em três linhas? Mesmo quando falava dos outros, sem usar o "eu" - caso das Considerações extemporâneas -, Nietzsche chega à conclusão de que no fundo falava "apenas de mim mesmo". Em Além do bem e do mal, as últimas dúvidas a respeito da questão foram dirimidas: "Toda a grande filosofia é a autoconfissão de seu autor e uma espécie de memória involuntária e despercebida". O Ecce homo é - portanto - o último elo de uma cadeia de observações acerca de si mesmo. Nele, conforme o já citado Freud, Nietzsche alcançou um grau de introspecção anímica que jamais foi alcançado por alguém e que dificilmente alguém voltará a alcançar um dia.
Autor: F. Nietzsche
Arte e Sociedade
Há estudiosos que veem na obra de arte uma manifestação pura e simples dos sentimentos individuais do artista. Outros a encaram como uma atividade plenamente lúdica, gratuita, livre de quaisquer preocupações utilitárias ou condicionamentos exteriores à sua própria criação.
Não é preciso negar totalmente a validade de cada uma dessas concepções para reconhecer na atividade artística algo que vai mais além: o fato de que a arte é um fenômeno social. Isso significa que é praticamente impossível situar uma obra de arte sem estabelecer um vínculo com uma determinada sociedade. a arte é um fenômeno social porque
- O artista é um ser social: como ser social, o artista reflete na obra de arte sua própria maneira de sentir o mundo em que vive, as alegrias e angustias, os problemas e as esperanças de seu momento histórico.
- A obra de arte é percebida socialmente pelo público: por mais íntima e subjetiva que seja a experiência do artista deixada em sua obra, esta será sempre percebida de alguma maneira pelas pessoas. A obra de arte será, então, um elemento social de comunicação da mensagem de seu criador.
Como fenômeno social, a arte possui relações com a sociedade. Essas relações não são estáticas e imutáveis mas, ao contrário, são dinâmicas, modificando-se historicamente. No que diz respeito ao artista, as relações da sua arte para com a sociedade podem ser de paz e harmonia, de fuga e ilusão, de protestos e revolta. Quanto à sociedade - considerando principalmente o Estado -, seu relacionamento com determinada arte pode ser de ajuda e incentivo, ou de censura e limitação à atividade criadora.
Livro: Fundamentos da Filosofia
O conhecimento profundo da natureza humana
Entendemos, aqui, por humanismo a postura filosófica que não quer afirmar ou negar a existência de Deus, na medida em que não precisa dela para fundamentar os valores da vida humana. O humanismo busca no conhecimento profundo da própria natureza humana a fundamentação para as normas éticas e os valores que devem orientar nossa vida individual e coletiva.
De acordo com essa visão, o sistema de valores que adotamos não pode ser definido em função de quaisquer desejos subjetivos ou preferências arbitrários, porque tanto o indivíduo como os grupos sociais podem estar momentaneamente dominados por desejos irracionais, patológicos e destrutivos. Hitler, por exemplo, queria ser o chefe supremo de uma "raça germânica superior", que dominaria o mundo inteiro. E levou grande parte da sociedade alemã de sua época a acreditar nos valores nazistas.
Portanto, para a ética humanista objetiva, apenas os valores "objetivamente válidos" devem orientar os desejos humanos.
E quais são, de modo geral, esses valores objetivamente válidos? Para Erich Fromm, valioso e bom é tudo aquilo que contribui para o maior desdobramento das faculdades específicas do homem que favorece a vida. Negativo ou mau é tudo que estrangula a vida e paralisa a atividade do homem (...) Vencer sua própria cobiça, amar seu próximo, o conhecimento da verdade (diferente do conhecimento não-crítico dos fatos) são as metas comuns a todos os sistemas humanistas filósoficos.
Bertrand Russell, por outro lado, afirma que o grande objetivo da ética é "produzir desejos harmoniosos em vez de desejos discordantes" entre os homens, pois isso aumentaria seu grau de felicidade.
Como isso pode ser conseguido? Russell responde que a tarefa não é simples, mas inclui o combate ao medos irracionais, a todos os preconceitos forjados pela ignorância, e a dissolução dos fanatismos em conflito, sejam políticos, religiosos etc. O mundo e os homem deveriam ser, também, objeto permanentes de estudo científico. Para ele, o hábito de basear suas crenças nos resultados da ciência já reflete a busca incessante dos homens por uma verdade cada vez mais plena.
Assim, o princípio ético fundamental de Russell pode ser resumido numa única frase: a vida feliz é aquela "inspirada no amor e guiada pelo conhecimento.
Livro: Fundamentos da Filosofia
Dostoiévski
Dostoiévski é mestre em mostrar que a teoria
natural do ser humano não pode descrever nada além do “chimpanzé de Darwin”. É
interessante notar que há uma concordância entre os teólogos russos de que, se
esse livro caísse nas mãos da grande tradição patrística, provocaria risos.
Eles iriam se deliciar com a destruição que Dostoiévski faz do ser humano
natural, mostrando que ele simplesmente é disfuncional, perdido na
circularidade dos argumentos. Nesse sentido, a obra de Dostoiévski é, na realidade,
uma espécie de comprovação experimental do caráter infernal da natureza. Essa
idéia, hoje, soa muito estranha, porque somos apaixonados por ela a ponto de
esquecermos, às vezes, que mesmo a doença, como um câncer, por exemplo, é
natural, por considerarmos que natural é sinônimo de bom.
Outra observação importante é sobre a crueldade do
texto, que salta aos olhos na fala do homem do subterrâneo. Dostoiévski faz uma
oposição entre o homem do subterrâneo e o homem de ação. O homem do subterrâneo
é aquele que sabe que está perdido no infinito, que, quando olha para dentro de
si mesmo, não encontra nada a não ser um eterno deslizar de significado sobre
significado, mas que, na realidade, não é nada: ele é o que descreve e, ao
mesmo tempo, não é. O homem de ação é o homem moderno, aquele que acredita em
si mesmo, que toma como causa primeira causas do seu comportamento; isto é,
confunde as causas a que tem acesso e as interpreta como causa daquilo que ele
é, como causa primeira e eficiente, quando se trata, na realidade, de causas
segundas. Exemplificando, quando se está em queda livre, na verdade não se
escolhe cair, pois é a gravidade que está exercendo atração – excetuando-se, é
claro, a possibilidade de alguém se jogar, em que temos uma duplicidade causal. A
base desse homem de ação é o utilitarismo inglês.
Autor: Luiz
Felipe Ponde
Segunda
variação: filosofia
Nietzsche
“O meu nome é Zaratustra, e me espanto de que
você me tenha pedido para tocar uma ‘variação filosófica’ na minha flauta. Com
certeza você não me conhece. Sou músico mas a música que toco não agrada aos
filósofos. Basta que eu comece a tocar para que os filósofos comecem a correr.
A
flauta que tenho na mão é a flauta de Dionísio, o deus grego da alegria. Ela
tem poderes mágicos, semelhantes aos da flauta do flautista de Hamelin. Quem
ouve a sua música fica alegre e se põe a dançar.”
Por
isso os filósofos correm: eles têm medo de que eu, com minha música, os faça
dançar. A dança é o que mais os amedronta. Porque dança é coisa que se faz com
o corpo inteiro. Mas os filósofos não têm corpo. Eles marcham, como soldados em
ordem unida.
“Por
muitos séculos esta flauta esteve enterrada. Desde Sócrates, quando a razão
triunfou sobre o instinto. Foi nesse momento, quando a flauta de Dionísio foi
enterrada, que a decadência do mundo grego começou”.
Essa
flauta tem o poder mágico de acordar o instinto. Aqui aparece o meu conflito
com os filósofos: falei em
magia. Para os filósofos, magia é superstição. Os filósofos
não acreditam que as palavras tenham o poder de criar. As palavras são, para
eles, apenas ‘ferramentas na oficina da razão. Eles ‘usam’ as palavras. Suas
palavras pertencem ao mundo da ‘utilidade’. Mas magia é, precisamente, criar
pelo poder da palavra.
Em
oposição aos filósofos, as palavras para mim são música. Eu as uso como quem
toca um instrumento, porque elas são belas, porque elas são diáfanas pontes
coloridas sobre coisas eternamente separadas, pelo prazer que me dão. As
palavras fazem amor. Minhas palavras pertencem ao mundo do deleite, da fruição.
Faço
isso não só por puro prazer, mas porque acredito que a beleza e a alegria são
divinas. São elas que dão ao homem o poder de contemplar e viver a tragédia sem
serem destruídos por ela. Foi assim que os gregos triunfaram sobre a tragédia:
eles a transformaram em
beleza. E ainda há alguns que me acusam de impiedade, de não
acreditar em Deus. Como
dizer isso, se a beleza existe? Acredito em Deus, sim, num Deus que dança...
Autor:Rubem Alves
Obra:Variações sobre o prazer pag.112.
ENSINAMENTOS DE ROUSSEAU
SER E PARECER
Uma experiência
vivida na infância pelo próprio Rousseau foi marcante para que ele percebesse o
quanto a certeza interior raramente é compreendida e compartilhada pelos
outros. O pai de Rousseau teve um grave conflito com o Sr. Gautier, capitão na
França. Por causa desse fato ele foi obrigado a sair de Genebra, deixando
Rosseau sob os cuidados do Sr. Lambecier, ministro em Genebra. Certo dia,
Rousseau, já vivendo na casa do Sr.
Lambecier, estava estudando em seu quarto a criada que trabalhava na casa
colocou alguns pentes para secar. Quando foi pegá-los, percebeu que um deles
estava com alguns dentes quebrados. A quem poderia ser atribuída a
responsabilidade por ter quebrado aquele pente? Apesar do grande esforço de Rousseau
em provar a sua inocência, a força da acusação do senhor e da senhora Lambecier
foi tão forte, que Rousseau não pode provar a sua inocência. Este caso foi
marcante para ele, pois foi a prova de que a força da aparência pode
sobrepujar, e muito, os fatos. Foi a partir desse acontecimento que Rousseau
pode “aprender que a íntima certeza da inocência é importante contra as provas
aparentes da culpa; acaba de aprender que as consciências são separadas e que é
impossível comunicar a evidência imediata que se experimenta em si mesmo.
Revista de Filosofia
Pg.17/18
A POLÍTICA CULTURAL DE PLATÃO
Platão (427-347 a .C) nasceu no dia dedicado ao deus. Apolo, sendo filho deste com a virgem Perictione. O recém-nascido foi saudado recebendo mel derramado diretamente em seus lábios por abelhas sagradas que habitam o Monte Hymettus. Um dia antes de ser apresentado a Platão, Sócrates teve um sonho no qual um cisne, pássaro símbolo de Apolo, pousava em seus joelhos. Desta forma, o gênio de Platão é explicado por sua origem divina.
Alfred Whitehead afirmou que toda a história da filosofia não passaria de uma série de notas de rodapé ao texto platônico; de modo similar, o filósofo Arthur Danto acredita que a história da filosofia seria uma série de emendas ao testamento platônico que baniu a arte de sua cidade ideal; já para Richard Rorty esta condição de apontamento ao texto platônico não seria válida apenas para a filosofia, podendo ser estendida a toda a cultura ocidental. Tais declarações grandiloquentes também produzem um efeito mistificador quanto ao gênio platônico, o entanto, provavelmente não temos outra forma para lidar com ele.
A obra de Platão sagrou o modo de vida de Sócrates e sua dedicação a busca da Verdade em oposição ao tipo de educação oferecido através dos poetas e dos sofistas. Os diálogos socráticos não foram uma invenção de Platão, mas ele foi o grande mestre nesta arte e conseguiu neles exercer seus dotes literários, construindo um gênero de discurso – que para Nietzsche, seria precursor do romance moderno, por sua mistura de gêneros e, principalmente, pela submissão da criatividade poética à racionalidade – o qual continuou empregando mesmo em seu período tardio, em textos onde a figura de Sócrates geralmente ficou ausente.
Revista de Filosofia
Pg.35-36-38-39
A AMIZADE EM EPICURO
Epicuro não diz, em nenhum momento, que a amizade é prazer. Adotar a amizade como uma perfeição em si mesma poderia nos induzir a uma
concepção de amizade que Epicuro não proferiu.
O historiador Diógenes Laércio (III d.C) diz uma quantidade tão grande de amigos que seria equivalente a cidades. Essa afirmação, apesar de exagerada, mostra como a amizade era relevante para a doutrina epicurista.
Em algumas de suas Máximas, Epicuro afirma que é a sabedoria que faz a amizade e que é a pessoa nobre que está em relação com a sabedoria e a amizade.
O elemento utilitarista que há no início da amizade, segundo a Sentença, é o benefício que os amigos esperam de uma relação que ainda não foi transformada em amizade.
Revista de Filosofia
Pg. 45-46-48-49-50
Da filosofia à sociologia
A sociologia é uma ciência que surge apenas no século XIX. Seu surgimento recente poderia nos dar a ingênua impressão de que aquela época os intelectuais não estavam preocupados com a reflexão sobre a vida social e coletiva. No entanto, naquele momento histórico, as questões que diziam respeito ao que hoje chamamos de “sociedade” eram pensadas sob a ótica da filosofia, particularmente da filosofia política. Ao aplicar os princípios da ciência ao estudo dos fenômenos sociais, os intelectuais mudaram a maneira de explicar a própria vida social. Na visão dos fundadores da sociologia, os fenômenos que caracterizavam a modernidade, seja no aspecto econômico, político ou cultural, não podiam mais ser explicados a partir de uma visão filosófica do mundo. Sustentavam que era preciso partir do método experimental e da observação da realidade empírica. É a partir deste esforço que surgiu a sociologia.
Para compreender a radicalidade desta mudança, vale a pena comparar a sociologia com a sua antecessora para destacar em que medida ela retoma e, ao mesmo tempo, modifica a maneira de pensar a vida coletiva que era própria da filosofia política.
Retomando a história do pensamento filosófico, podemos identificar na filosofia política dois momentos fundamentais. O primeiro está ligado ao mundo grego e ao surgimento das teorias políticas de Platão (427-347 a .C.) e Aristóteles (348-322 a .C.). o segundo está ligado ao início da era moderna e é representado pelas teorias do contrato social de Hobbes (1588-1689), Locke (1632-1704) e Rousseau (1712-1778). Conforme mostra a análise de Noberto Bobbio (1986), em cada um dos períodos assinalados podemos localizar duas formas de pensar a realidade política, que podem ser representadas pelos nomes de Aristóteles e Hobbes. O paradigma aristotélico e o paradigma hobbesiano nos apresentam formas distintas para explicar os seguintes elementos do poder político: 1) sua origem, 2) natureza, 3) estrutura, 4) finalidade, 5) fundamento e 6) legitimidade. É que explica o esquema abaixo:
PARADIGMAS DA FILOSOFIA POLÍTICA
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Aristóteles
|
Hobbes
| |
1)Origem
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Histórica
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Racionalista/hipotética
|
2)Natureza
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O poder político é natural
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O poder político é artificial
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3)Estrutura
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O Estado precede o indivíduo
|
O indivíduo precede o Estado
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4)Finalidade
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Valorização da desigualdade
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Valorização da igualdade
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5)Fundamento
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Natural
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Social
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6)Legitimidade
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Pela força das coisas
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Pelo consenso
|
O surgimento da sociologia representa uma terceira onda na história do pensamento social. Diante do quadro de transformações da modernidade, a sociologia retoma os temas da filosofia política, mas busca substituir as questões tradicionais desta forma de pensamento por um novo olhar sobre o mundo humano. Com o surgimento da sociologia, as questões da filosofia política são retomadas e ampliadas, pois ela opera um deslocamento tanto no objeto quanto no método da reflexão política. Não se trata mais de se referir apenas ao fenômeno do poder político, como se fazia até então. O pensamento deveria deslocar-se para além da “polis” ou mesmo do “Estado”, como fizeram os autores da filosofia até aquele momento. O que os estudiosos da sociologia desejavam é que esta nova ciência abarcasse todos os fenômenos sociais, incluindo a ordem econômica, política e cultural em um único conjunto que pudesse ser estudado com o auxílio do método experimental. É desta forma que nasce a “ciência” do “social”.
Autor: Carlos Eduardo Sell
Livro: Sociologia Clássica
Pg. 21/22
Nietzsche: do julgamento da civilização à questão da existência humana
Interessou-se definitivamente pela filosofia após a leitura de O mundo como vontade e representação, de Schopenhauer. Faleceu a 25 de agosto de 1990, vítima de uma paralisia progressiva, provavelmente causada por uma moléstia de origem sifilítica.
Nietzsche escreveu sob a forma de aforismos (máximas ou sentenças curtas que exprimem um conceito) a maior parte de suas obras. Esses aforismos tratam de diversos temas, como religião, moral, artes, ciências etc. seu conjunto revela, no entanto, como preocupação básica uma crítica profunda e impiedosa à civilização ocidental. Crítica à massificação, à visão de mundo burguesa, ao conservadorismo cristão (“moral de rebanho”) etc. dessa crítica surgiu também a questão do valor da existência humana.
A filosofia nietzschiana não deixou pedra sobre pedra. Foi um tribunal do qual não escapou nem mesmo a própria filosofia, reduzida a pedaços. A propósito de sua fúria, Nietzsche teria dito de si mesmo:
Não sou um homem, sou uma dinamite.
Segundo a análise de Nietzsche, no momento em que o cristianismo deixou de ser a única verdade para se tornar uma das interpretações possíveis do mundo, toda a civilização e seus valores absolutos foram postos em xeque.
Portanto, a filosofia de Nietzsche situa-se fundamentalmente na etapa do “Eu quero” do século XIX (ver quadro acima”, quando os valores morais estavam em crise, dando origem ao niilismo perfeito da Europa.
Ser niilista significa não crer em qualquer verdade moral ou hierarquia de valores.
O niilismo de Nietzsche baseava-se na afirmação da “morte de Deus”, isto é, na rejeição à crença de um ser absoluto capaz de traçar “o caminho, a verdade e a vida” da civilização européia. Em consequência, Nietzsche proclamava a ruína dos valores tradicionais que sustentavam a moral burguesa e cristã européia e negava a idéia de progresso ou a crença num futuro glorioso.
O niilismo de valores fez surgir o niilismo existencial, a experiência de que não vale a pena viver. A vida é uma dor sem sentido.
Através da doutrina do eterno retorno, Nietzsche pensará a superação do niilismo. Como dissemos, Nietzsche se proclamou “o primeiro niilista perfeito”, mas acrescentou depois “que superou o niilismo” pois acreditava na vontade humana e na capacidade de se produzirem valores “afirmativos da vida”.
Livro: Fundamentos da Filosofia
Autor: Gilberto Cotrim
“Escritos Essenciais...”
John Main, ESSENTIAL WRITINGS, ed. Laurence Freeman (Marynoll, NY: Orbis, 2002), p. 109.
O propósito de se repetir o mantra é que ele se torne o foco de sua atenção. Nós não estamos pensando em algo nem estamos perseguindo qualquer "insight" que possa surgir enquanto dizemos o mantra. Deixem que eles desapareçam na medida em que você entra num silêncio mais profundo, onde o único som na sua mente é o do mantra.
O mantra por si lhe ensinará a paciência necessária para dizê-lo. Na meditação nós estamos simplesmente buscando aceitar a dádiva da nossa própria criação, tão plenamente quanto podemos no presente e, responder a ela tão generosamente quanto possamos. Para fazer isto, aprendemos a ficar imóveis, a ficar em silêncio e, a ser verdadeiramente humildes.
Na linguagem comum do dia a dia, a essência da meditação consiste em deixar o ego para trás. Não tentamos ver com o ego, o que está acontecendo. A visão do ego é limitada por ser auto centrada. O olho com o qual vemos sem limites é o olho que não pode se ver a si mesmo. O paradoxo da meditação é que quando desistimos de ver e de possuir, então, nós vemos tudo, e todas as coisas são nossas.
Medite por Trinta Minutos...
Lembre-se: Sente-se. Sente-se imóvel e, com a coluna ereta. Feche levemente os olhos. Sente-se relaxada(o), mas, atenta(o). Em silêncio, interiormente, comece a repetir uma única palavra. Recomendamos a palavra-oração "Maranatha". Recite-a em quatro silabas de igual duração. Ouça-a à medida que a pronuncia, suavemente mas continuamente. Não pense, nem imagine nada, nem de ordem espiritual, nem de qualquer outra ordem. Pensamentos e imagens provavelmente afluirão, mas, deixe-os passar. Simplesmente, continue a voltar sua atenção, com humildade e simplicidade, à fiel repetição de sua palavra, do início ao fim de sua meditação.
Immanuel Kant, um divisor de águas
No campo da Filosofia
A Filosofia tem pelo menos dois pensadores reconhecidos como “Divisores de Água”: Sócrates e Kant. Enquanto o primeiro mudou o olhar empreendido pelos pensadores anteriores (por isso chamados de pré-socráticos), Kant traçou os limites do conhecimento humano, no período em que a crença na “Razão” propalava a idéia de que o homem tudo podia conhecer.
“Kant era, justamente, com um tal propósito delirante, o bom filho do seu século, que mais que qualquer outro pode ser denominado de o século do delírio [...]. Também ele foi mordido pela tarântula moral Rousseau, também ele tinha no fundo da alma o pensamento do fanatismo moral [...]”
“O nosso filósofo [...] sentiu, à medida que envelhecia, uma grande vontade de preservar para ele e o mundo pelo menos os pontos essenciais da fé tão profundamente inculcada nele por sua mãe” (DURANT, 2000)
Autora: Jaya Hari Das
Revista de Filosofia n°36 pg. 29,33-34
A Dialética
Do grego dialéktikós, a palavra “dialética” é normalmente referenciada nos dicionários como “a arte do diálogo” ou como “a habilidade de argumentação”. A dialética estabeleceu-se, portanto, como um método de diálogo, de debate, o que conseqüentemente elevou-a à categoria de instrumentos e conceito filosófico. Os filósofos gregos, desde os pré-socráticos, já se ocupam de pensar executar as questões relativas à dialética. Para Aristóteles de Estagira, Zenão de Eléia (490 a .C ? – 430 a .C ?) pode ser considerado um fundador da dialética na filosofia, ainda que a tradição também situe Sócrates e Platão como pensadores da dialética. O filósofo alemão Georg W. F Hegel formulou e sistematizou o método dialético quando propôs que a dialética era um excelente modo para pensar um mundo e suas mudanças, pois colocava duas posições contrárias (tese e antítese) que viriam a criar uma terceira concepção (síntese). Karl Marx, que considerava o hegelianismo idealista, adapta o modelo hegeliano e desenvolve o materialismo dialético para analisar as tensões e a perspectivas de conflito entre as classes sociais. Max Horkeimer e Theodor Adorno vão retomar o método dialético (em uma leitura da teoria critica frankfurtiana) no livro A Dialética do Esclarecimento. Um bom livro de introdução ao tema é O que é Dialética, do filósofo Leandro Konder.
Autor: Emerson J. Sena Silveira
Revista: Filosofia pg. 23
O inferno de Jean-Paul Sartre
Escrita pelo filósofo Jean-Paul Sartre em 1944, a peça – “Entre quatro paredes”, a perspectiva existencialista do autor – a de que estamos sós em um mundo repleto de absurdos, tentando confrontar nossos desejos com os dos outros e com os padrões sociais. No texto, três desconhecidos são condenados a passar a eternidade em um quarto sem portas, espelhos e janelas, uma metáfora da máxima de Sartre de que “o inferno são os outros”.
O inferno de Sartre não tem instrumentos de tortura, fornalhas e outros objetos que povoam o imaginário. É um salão ricamente decorado, com sofás, uma estátua de bronze e uma lareira que nunca é apagada, que mantém uma desconfortável sensação de calor e claridade permanente. Os condenados não têm pálpebras, por isso não fecham os olhos ou piscam, o que pode ser entendido como a perda da possibilidade de refugiar-se em si próprio. Os personagens criam um pequeno teatro da dor de depositar expectativas no outro – a homossexual Inês tenta seduzir a fútil Estelle, que por sua vez se exaspera por não identificar nenhuma demonstração de desejo no único homem da sala, Garcin. Um simbolismo do pensamento sartriano de que a condição humana é a liberdade e que negá-la é condenar-se voluntariamente ao inferno.
Autor: Huis Clos
Revista: Mente Cérebro ano XIX N° 235
7 coisas que não lhe contaram sobre a
"a reação à crítica contra a Maomé":
Como qualquer pessoa, a maioria dos muçulmanos acharam o vídeo islamofóbico de 13 minutos de má qualidade e ofensivo, e os protestos se espalharam rapidamente, tocando em feridas compreensíveis e duradouras sobre o neo-colonialismo dos EUA e a política externa ocidental no Oriente Médio, assim como a sensibilidade religiosa no que diz respeito a representações do profeta Maomé. Mas frequentemente a cobertura de mídia omite algumas informações importantes:
- As estimativas iniciais mostram que a participação em protestos contra o filme representam de 0,001 a 0,007% da população mundial de muçulmanos: 1.5 bilhão de pessoas -- essa porcentagem representa uma pequena fração do número de pessoas que marcharam pela democracia durante a Primavera Árabe.
- A grande maioria dos protestos foram pacíficos. As violações das embaixadas estrangeiras foram quase todas organizadas ou nutridas por indivíduos do movimento salafista, um grupo radical islâmico que se preocupa mais com destruir os grupos islâmicos populares moderados.
- Oficiais líbios e americanos de alto escalão estão divididos sobre se o assassinato do embaixador dos EUA na Líbia foi planejado previamente para coincidir com o aniversário do 11 de setembro, e portanto não estaria relacionado com o filme.
- Além dos ataques feitos pelos grupos militantes radicais na Líbia e Afeganistão, uma avaliação das notícias atuais feita no dia 20 de setembro sugeriu que os manifestantes mataram, ao todo, zero pessoas.
- Quase todos os líderes mundiais, muçulmanos ou ocidentais, condenaram o filme, e quase todos eles condenaram qualquer tipo de violência que possa vir a acontecer enquanto resposta.
- O papa visitou o Líbano no auge da tensão, e líderes do Hezbollah participaram do sermão papal, abstiveram-se de protestar sobre o filme até que a santidade deixasse o local, e clamaram por mais tolerância religiosa. Sim, isso aconteceu.
- Após o ataque em Bengazi, cidadãos comuns foram às ruas da cidade e em Tripoli com cartazes, muitos deles escritos em inglês, com pedidos de desculpas e afirmando que a violência não os representava, nem sua religião.
Além dos pontos listados acima, há um grande número de notícias que foram ignoradas pela mídia na semana passada para dar margem a capa da revista Newsweek, a #MuslimRage e a cobertura dos conflitos. Na Rússia, dezenas de milhares protestaram nas ruas de Moscou contra o presidente russo Vladimir Putin. Centenas de milhares de portugueses e espanhois marcharam em protestos contra austeridade; e mais de um milhão de catalãos marcharam por independência.
O movimento Expressionista
Os expressionistas tinham como meta integrar a arte com a vida e neste contexto passaram a representar o inconsciente coletivo da sociedade. Trata-se de uma arte subjetiva que aborda temas densos e dramáticos como a miséria, a guerra, a angústia, a dor e até mesmo a revolta contra o mundo burguês.
O Expressionismo é considerado um movimento artístico europeu que teve raízes na Alemanha entre 1905 e o início da primeira Guerra Mundial, 1914. O termo foi usado pela primeira vez na revista Der Sturm (A tempestade), um importante periódico do movimento marcado pela oposição ao Impressionismo francês.
Para alguns estudiosos, o Expressionismo é mais um “clima” do que um movimento artístico, pois seus representantes se preocupavam com o mundo da sua própria verdade. Nesse sentido, ele é considerado uma arte subjetiva que aborda temas densos e dramáticos como a miséria, a guerra, a tristeza, a angustia, a dor e até mesmo a revolta contra o mundo burguês. Usando cores fortes e agressivas, os artistas representavam suas esperanças, rancores, ódios, ansiedades, medos, dores, aspirações e sonhos.
Para os expressionistas, a arte e a sociedade eram ligadas. Eles sentiam a necessidade de rejeitar a prosperidade materialista. Alguns tinham visões catastróficas e neuroses a respeito de alterações que mudariam o panorama da Europa de acordo com as ideias de alguns filósofos como Nietzsche. Grande parte dos artistas abominavam o entusiasmo pela guerra e suas consequências. Nesse contexto, eles sentiam a necessidade de romper com a velha ordem, a forma antiquada com que a vida era encarada.
Revista: Filosofia nº 10 - pág.53-54
Autor: Ana Elizabeth
Nelson Rodrigues e a Filosofia
Nelson Falcão Rodrigues, o quinto de quatorze irmãos, filho do jornalista Mário Rodrigues, tornou-se o nosso “boca de ouro”. Talvez por ter sido cronista policial e esportivo, sua obra revela o que há de mais dionisíaco e trágico em nossa cultura, construída sob o estigma do “complexo de vira-latas”, expressão por ele criada.
Como Nelson dizia, “toda unanimidade é burra”. Se o grande intelectual Alceu Amoroso Lima, o Tristão de Athayde, não aceitou a amizade de Nelson Rodrigues, acusando-o de viver na lama, foi desse pântano humano demasiado humano que ele trouxe à luz jóias raras.
A crítica da moral burguesa em Nelson Rodrigues: apologia da ética por meio da transgressão. Apresentando uma sucessão cadenciada de fatos que se encaixam formalmente no normal e no cotidiano, Nelson Rodrigues penetra no psiquismo doentio e hipócrita, revelando, pouco a pouco, o absurdo e o insano que se escondem sob os véus do aceitável e do prosaico. Nesse sentido, sua obra é profundamente filosófica, uma verdadeira investigação sobre a natureza humana. Filosofar é rasgar o verbo.
Revista: Filosofia nº73 pág. 36
Autores: André Arya e Francisco P. Greter
Línguas e Levinas
Os viesses da linguagem e traduções na Filosofia e a convivência com Levinas: este foi o resultado da conversa de Lúcio Packter com dois importantes nomes da Universidade hebraica de Jerusalém.
Sendo a Filosofia o resultado de uma reflexão sobre a sabedoria, mais do que a sabedoria mesma (a qual seria Sofia e não filosofia), ela compartilha com a língua a dimensão metalingüística.
Filosofar é possível em todas as línguas, mas está certo que não possível chegar a uma compreensão profunda das filosofias grega e alemã sem ter acesso ao texto original.
Existe uma grande diferença entre o Levinas oral e o Levinas escrito. O Levinas oral era uma pessoa pitoresca, capaz de se explicar de forma gráfica, com o corpo.
Hoje estamos em uma espécie de luta, cada um de nós como pessoa luta, está em um triângulo, onde luta entre tentação e norma, entre dúvida e fé, entre desesperação e esperança.
Revista: Filosofia nº 72 pág. 5-12
Autor: Lúcio Packter
AFORISMOS RODRIGUIANOS
“Toda a unanimidade é burra.”
“Invejo a burrice, porque é eterna.”
“O dinheiro compra até o amor verdadeiro.”
“Só o cinismo redime o casamento. É preciso muito cinismo para que um casal chegue às bodas de prata.”
“O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: o da inexperiência.”
“Deus só frequenta as igrejas vazias”.
“ A fome é mansa e casta. Quem não come não ama nem odeia.”
“Não reparem que eu misture os tratamentos de tu e você. Não acredito em brasileiro sem erro de concordância.”
“Se Cristo, em vez de morrer na cruz, tivesse morrido de coqueluche aos quatro anos, não teria sido Cristo.”
“A dúvida é autora das insônias mais cruéis.”
“Um filho numa mulher é uma transformação. Até uma cretina, quando tem um filho, melhora.”
“Nunca a mulher foi menos amada do que em nossos dias.”
“O Natal já foi festa, já foi profundo gesto de amor. Hoje, o Natal é um orçamento.”
“As feministas querem reduzir a mulher a um macho mal-acabado.”
“O boteco é ressoante como uma concha marinha. Todas as vozes brasileiras passam por ele.”
“A cama é um imóvel metafísico.”
“Até os canalhas envelhecem.”
“Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.”
“Acho a velocidade um prazer de cretinos. Ainda conservo o deleite dos bondes que não chegam nunca.”
“A televisão matou a janela.”
Revista: Filosofia nº73 pág. 41
A filosofia é importante?
Muitas pessoas consideram a Filosofia como algo confuso e difícil. Muitas concepções errôneas tem sido elaboradas sobre ela. Na verdade, o seu grande objetivo é nos ensinar a refletir, a perceber alternativas e pontos de vista diferentes sobre questões ou problemas.
Será que a filosofia é importante para nossa vida? Seu significado etimológico, em parte, pode revelar sua importância. A palavra é de origem grega e significa “amor à sabedoria” (filos=amor e Sofia=sabedoria). Assim, a filosofia nos ensina a sermos mais sábios, esclarece questões e nos ajuda a analisar as ideias.
Segundo a tradição, a palavra foi criada pelo antigo filósofo e matemática grego Pitágoras. Conta-se que ao ser questionado por um príncipe sobre qual natureza da sua sabedoria, ele respondeu que ele era apenas um filósofo, ou seja, um amigo e amante da sabedoria.
Na antiga Grécia, a palavra filosofia significava um tipo de sabedoria especial associada ao uso da razão e da investigação. Dessa forma, diversos aspectos e questões sobre a vida passaram a ser esclarecidos pela filosofia. Até então, eram explicados por meio de mitos.
Mas será que ela é relevante na vida real? Para grande parte das pessoas, a filosofia é considerada como algo confuso. Difícil e não nos leva a nada. Estas impressões com o tempo fizeram nascer em torno da filosofia uma série de definições errôneas e pejorativas. Entretanto, todas essas impressões distorceu o seu verdadeiro objetivo.
O filósofo Bertrand Russel, em sua obra Delineamentos da Filosofia, dizia que “é preciso que se tenha grande desejo de saber, combinado a grande cautela quanto ao que se julga saber; deve-se, ainda, possuir penetração lógica e o hábito do pensamento exato. Tudo isso, por certo, constitui uma questão de grau, de todo pensamento humano; podemos diminuí-las indefinidamente, mas não a podemos abolir completamente. A filosofia é, assim, uma atividade contínua e não algo em que possamos atingir, de uma vez por todas, uma petição final.”
Dessa forma, a filosofia não nos fornece respostas prontas ou acabadas, mas nos ensina a refletir, a perceber alternativas e pontos de vista diferentes sobre uma questão ou problema.
A influência da filosofia na vida humana é muito antiga. Ideias filosóficas frequentemente produzem efeitos nas sociedades humanas.
A filosofia não serve apenas para pensarmos de forma contemplativa sobre as coisas e acontecimentos que nos rodeiam, mas para transformá-los. O seu ensino tem como objetivo estimular o desenvolvimento da reflexão e fornecer ideias que fazem parte da história do pensamento filosófico.
Revista: Filosofia nº 10 - pág.63-64
Autor: Ana Elizabeth
O SIGNIFICADO DO AMOR
Diversas teorias tentam explicar o amor. Mas o que significa amar uma pessoa? Antes de tentar responder à questão, tente imaginar a vida sem amor em seus diversos aspectos (romântico, amizade, etc.). A vida provavelmente ficaria sem sentido com a ausência desse sentimento, pois ele dá colorido e forma ao nosso cotidiano, nos inspira a sermos melhores como pessoas.
Passamos grande parte da vida procurando entender de forma racional e lógica os porquês do amor. Tentamos compreender os relacionamentos que nascem e morrem rapidamente, as amizades que perduram apesar da ausência ou distância, pais amorosos ou ditadores, mães acolhedoras ou perversas, etc. A nossa razão não consegue explicações para esses fatos e, assim, é muito comum encontrar respostas sobre o amor em seu aspecto espiritual ou religioso.
A estudiosa Lara Kaliich, formada em Biologia e Filosofia do Amor, explica as razões e os porquês do amor de uma forma interessante.
Para a autora, “devemos pensar em amar outra pessoa como o ato de amar a si mesmo através de outra pessoa – em outras palavras, nós amamos as pessoas que nos fazem sentir melhor sobre nós mesmos, que trazem o melhor de nós mesmos.
Eu amo o outro em mim
Quando surge o amor,
não é só o sentir o outro e desejá-lo,
mas é o bem-estar que o outro faz sentir em si,
como se, ao amar a outra pessoa,
pudesse amar-se a si próprio e,
assim, isso completasse de forma integral
o vazio que se sentia ante de descobrir-se amando.
Revista: Filosofia nº 10 - pág. 43
Autora: Ana Elizabeth
A Europa Iluminista
A Europa iluminista tem seus fundamentos bem definidos na Europa renascentista, do retorno à Antiguidade Clássica, da valorização do homem, em que o jargão socrático “conhece-te a ti mesmo” é retomado. Novamente Sócrates, e não por acaso, uma vez que, logo de início, foi estabelecida aqui uma relação entre ele e Kant, ao citá-los como dois grandes “divisores de água” na Filosofia. O iluminismo, ou Era das Luzes, como também ficou conhecido, desabrochou em uma Europa marcada por grandes transformações sociopolíticas, nas qual a França fora uma das protagonistas. Os pensadores iluministas franceses se autodenominavam “les philosophes”, muitos deles burgueses e boêmios, mas todos sem exceção, cidadãos da “república das letras”- espírito que se generalizou em clubes, cafés e salões literários. “Les philosophes tornam-se sinônimo de subversão e pornografia por defender e praticar a liberdade de pensamentos, de que resulta uma nova concepção do mundo e do homem” (ABRÃO, 2004). Dentre eles estavam Voltaire, Diderot, d’Alembert, Montesquieu, Rousseau e Condorcet.
O iluminismo alemão não precisou de uma “revolução” como a “francesa”, no entanto, a futura Alemanha, que nada mais era, naquela época, que um aglomerado de Estados, que via sua língua sendo preterida ao latim ou ao francês, conseqüentemente não ficou incólume a uma revisão geral de valores, ambiente ideal para uma “crítica radical”, até mesmo da própria razão, que recebeu o nome de Aufklãrung. É nesse contexto que Kant, então, propõe que a razão “estabeleça um tribunal que, ao mesmo tempo que assegure suas legítimas aspirações, rechace todas as que sejam infundadas, e não o fazendo mediante arbitrariedades, mas segundo suas leis imutáveis”.
O idealismo transcendental kantiano, como ficou conhecida a filosofia do pensador de Königsberg, não é de fácil compreensão, mas pode ser estudado em suas duas grandes obras: Crítica da Razão Pura (1781) e Crítica da Razão Prática(1788). Conta-se que Herz, depois de receber o manuscrito da Crítica das mãos do próprio Kant, o teria devolvido, sem lê-lo por completo, dizendo temer “ficar louco” se o fizesse – “Kant é a última pessoa do mundo que devemos ler sobre Kant” (DURANT, 2000). Essa dificuldade em lê-lo se deve a que, ao elaborar sua estratégia de ataque aos critérios do conhecimento, o filósofo, antevendo os ataques que também receberia de seus oponentes, decide, perspicazmente, que deveria “falar outra língua”, tecer suas idéias em um linguagem própria, de difícil compreensão vulgar. Assim, para combatê-lo, é necessário subir às suas alturas, onde seu contestador terá de escolher entre “respirar ou lutar” – “Aproximemo-nos dele por desvios e com cautela, começando a uma distância segura e respeitosa; [...] e depois avancemos tateando em direção áquele sutil centro em que o mais difícil dos filósofos guarda o seu segredo e o seu tesouro”.
Imperativo Categórico Kantiano
O imperativo categórico kantiano não se pretende uma “máxima ecumenicorreligiosa”, mas caberia muito bem em qualquer dos Evangelhos, sem destoar das pregações do Cristo – “Não julgueis, e não sereis julgados. Porque do mesmo modo que julgardes, sereis também vós julgados e, com a medida com que tiverdes medido, também vós sereis medidos” (Mateus, 7:1-2). Kant acreditava fielmente na capacidade do ser humano de dominar seus instintos mais perversos através da assunção de sua obra, deixar isso bem claro – “[...] a malignidade da natureza humana não deve, na verdade, ser chamada de maldade, se esta palavra for tomada em sentido rigoroso, isto é, como intenção (princípio subjetivo das máximas) de admitir o mal enquanto mal como motivo em sua máxima (pois isso seria uma intenção diabólica), mas, antes, perversão do coração, o qual segundo a conseqüência, é designado então igualmente de má vontade. Esta não é incompatível com uma vontade em geral boa: provém da fragilidade da natureza humana [...]”. Se isso por si só não bastar para fundamentar o argumento que acabo de levantar, que tal, então: “Toda má ação, quando procuramos sua origem, deve ser considerada como se o homem tivesse chegado a isso diretamente do estado de inocência”? Com isso ele pretendia dizer: “Se estivesse em pleno usufruto de sua autonomia, de sua liberdade e de sua racionalidade, jamais cometeria um ato infame, ainda que forças volitivas em seu espírito tentassem movê-lo a tal!”. Alguns comentadores do filósofo e de sua “máxima moral” perceberam também a proximidade que há entre ela e o ideal religioso: “Vivamos de acordo com este principio, em breve iremos criar uma comunidade ideal de seres racionais; para criá-la, precisamos apenas agir como se já pertencêssemos a ela; [...] só assim poderemos deixar de ser animais e começar a ser deuses” (DURANT, 2000).
Sim! O idealismo kantiano, visto por nós, homens do século 21, que sabemos perfeitamente que aquelas luzes do século 18 não foram capazes de iluminar suficientemente as mentes e os corações dos homens, de modo a evitar duas Grandes Guerras, no século 20, e toda uma série de outras pequenas e grandes calamidades perpetradas pela malignidade humana, sim! O idealismo kantiano pode ser chamado de utópico. Mas não esqueçamos que “utopia” não significa apenas o lugar impossível, irreal. Ela também é o “lugar dos sonhos”, e por que, então, não poderia ser também “o lugar dos nossos objetivos?
Autora: Jaya Hari Das
Revista de Filosofia n°36
PLATÃO E AS DEFINIÇÕES DE JUSTIÇA
No primeiro livro, daquela que é considerada sua obra-prima. A República, Platão coloca lado a lado as definições de justiça da época – e, em certa medida, da tragédia -, “fazer bem aos amigos e mal aos inimigos” (332ª-e), e lírica, “dar a cada um o que lhe for devido” (331ª-e) e da sofística, “a justiça é a conveniência do mais forte” (338c). Ao longo de todo o diálogo, Sócrates irá mostrar por que nenhuma dessas definições é a adequada. Como sabido, Platão discordava da posição dos sofistas que acreditavam poder ensinar a virtude política a quem quer que fosse. Na República irá demonstrar que só determinadas pessoas nascem com o dom da sabedoria política. Aquele que não possui de nascença uma alma afeita à prudência e à sabedoria não pode governar a cidade. A política, assim como as outras atividades, exige um tipo específico de habilidade e técnica. Um treinamento externo não vai conseguir fazer despertar esse dom se o aluno já não o carregar dentro si. Platão defende um tipo atenuado de regime aristocrático, pois apesar de acreditar que os melhores, isto é, os melhores não em força, mas em sabedoria, devam governar, não crê que o talento político possa ser passado de pai para filho, é preciso que se nasça com ele.Percebemos com essa exposição que a tradição filosófica grega está em direta conexão com a tradição dramática e poética.A famosa expulsão dos poetas da cidade ideal no livro X da República deve, por isso, ser considerada como mero artifício retórico. Platão só faz uso desse artifício por querer enfatizar a sua posição, não porque acreditasse de fato que as educações política e moral pudessem ser realizadas sem a ajuda dos poetas e dramaturgos.
Infelizmente muita gente levou essa expulsão a sério e até hoje sofremos os efeitos colaterais dela. A poesia e a literatura foram equivocadamente expulsas dos departamentos de filosofia e em seu lugar colocamos as “deusas” ciência e epistemologia. Os gregos nos legaram uma lição riquíssima que não soubemos aproveitar. Ao invés de estimular nossas escolas e universidades a adotar em seus currículos,além das ciências as artes em é de igualdade, menosprezamos o seu papel na educação e conferimos-lhes um papel subalterno na mesma. Nossos poetas e escritores nacionais são esquecidos, quando na verdade poderiam estar dando uma enorme contribuição para a formação moral das nossas crianças e nossos jovens.. Esse quadro não irá mudar infelizmente, enquanto não recuperarmos o sentido verdadeiramente humanístico da educação.É preciso que a sociedade veja no artista não a figura vaidosa, mas alguém que deseja contribuir para o engrandecimento moral de todos.
Autora: Susana de Castro
Revista: Filosofia n°24 Pg.38
O último homem e o além-do-homem
Nietzsche vê no modo de vida moderno uma anulação da subjetividade humana, em que a individualidade se perde, e em que impera a massa de rebanho, o espírito gregário e o conseqüente embotamento do indivíduo. Ele é, sem dúvida, o grande gregário e o conseqüente embotamento do indivíduo. Ele é, sem dúvida, o grande teórico e crítico da modernidade, que faz, para usar os termos do primeiro, uma “análise implacável de tudo que existe”. As poderosas teses levantadas pó Nietzsche contra a religião, a moralidade e a Filosofia misturam a análise mais crua, inspirada no Iluminismo, com uma vitalidade romântica, para atacar os aspectos da cultura moderna que contrariam a vida. Essa é uma Filosofia da vida, vitalista. Nietzsche é um autor bombástico que não tem receios de produzir uma Filosofia a golpe de martelo. Sua critica ferrenha à modernidade passa pela formação, social que cria um homem, segundo ele, fraco, humano, demasiadamente humano.
Defendendo que o homem é a somatória de impulsos, desejos e vontades, acredita que a visão de animal racional aceita pelo Ocidente como definidora do ser humano é equivocada, pois a razão é um produto cultural, social. A razão seria fruto de uma vida gregária que só surge em decorrência das circunstâncias as quais os indivíduos forma expostos.
Vivendo no mundo da razão e, portanto, valorizando a consciência como seu espaço privilegiado, o ser humano cria uma série de regras morais de convivência que o limitarão como ser humano. Dentre essas morais, o cristianismo é a que Nietzsche dedica mais tempo e espaço de reflexão. O cristianismo representa para Nietzsche uma moral dos fracos, pois valoriza o servilismo, a humildade, a aceitação, o conformismo com um tipo de sofrimento que só retrai, submete.
O cristianismo seria o legítimo formador de uma massa de rebanho, sem força, individualidade ou autonomia. Seria uma moral massificadora e de escravos. A modernidade, vitimada pelo capitalismo e herdeira da moral cristã, será fatal para as possibilidades da vida humana.
A antropologia nietzschiana passa pela defesa de uma superação desse humano que aí está. Na defesa de um super-homem que teria em si resguardada a força, os instintos e os desejos, rejeita-se o homem que surgiu do tipo de sociabilidade que criamos. O homem seria o meio entre o animal e o super- homem. A defesa do super-homem, em última instância, representaria um ultrapassamento da modernidade. O retorno do homem a si mesmo, resgate daquilo que perdeu quando se tornou consciência.
Numa perspectiva vitalista, Nietzsche se apega na antiga concepção do mundo grego – entre os princípios apolíneos e dionisíacos, quando estes estavam em vigência, e advoga em favor da vontade humana.
E é um meio a esse contexto de domesticação do homem que se gesta o seu contrário, é aí que Nietzsche desenvolve seu conceito de “além-do-homem” (Übermensch) como contramovimento, visando fazer face à mediocrização em andamento na modernidade, que infelizmente toma consciência de si na figura histórica do niilismo europeu. Quem é o além-do-homem? É a representação da vontade de potência, da força e do desejo, da experiência que perfura e fortalece. O além-do-homem é da arte, da vida, do corpo, amoral. Indivíduo soberano, autêntico, é uma espécie de homem mais desenvolvida. Essa seria, portanto, uma existência sobre-humana, radicalmente singular, corporal, livre.
Essa vida é vida de fato! E essa vida vale a pena ser vivida. Uma vida de experiências intensas, de contato com a terra, de realizações de desejo, de exercício da vontade. Uma vida que ao morrer seria mais que morte, seria consumação, combustão. O avesso da morte em vida do último homem, o além-do-homem acaba, esgota-se de tanta vida, a morte é apenas o acabamento de uma existência vivida em sua intensidade. Essa vida valeria ser vivida tantas vezes quanto fosse possível.
Autores: Suze Piza / Daniel Pansarelli
Revista de Filosofia N°24 Pg. 20-21
A noção de "PESSOA"
ao longo do tempo
O homem começou a se indagar na Grecia antiga, quando
a Filosofia estava apenas começando. Deste período
até hoje, a ideia que se tem sobre o tema passou
por muitas mudanças. Leia, a seguir, nesta breve linha
do tempo, como se construíram as visões que
predominaram ao longo da história:
Antiguidade:
Sócrates (469-399 a.C.) foi o filósofo que trouxe
o exame da vida humana para o centro do debate.
Ele muda o foco da Filosofia do cosmos para o
anthoropos, indagando sobre temas como a virtude,
a justiça e o poder.
Platão (428/427 - 348/347 a.C) e Aritóteles (384-322 a.C)
ambos desenvolveram as questões a respeito do homem
levantadas por Sócrates e tentaram encontrar definições
para o ser humano.
Idade Média:
→ Seus vários períodos, marcados pelo domínio da
Igreja católica, não se restringiam a considerar o
homem como imagem e semelhança de Deus. Ele também
foi pensado como parte de um projeto cosmo-teológico
que o colocava como pivô de forças cósmicas em combate.
Modernidade:
→O iluminismo - funda as bases da moderna noção de pessoa,
que passa a ser pensada como racional, livre e responsável
por suas ações.
Immanuel Kant (1724-1804) - o filósofo escreve sobre o
iluminismo, na Resposta à questão: o que é o iluminismo,
e afirma ser ele a chegada do ser humano à sua maioridade,
o que significa a liberdade de decisão por si mesmo e, em
contrapartida, a liberdade de suas ações. Na Crítica da
Razão Prática, afirma que as pessoas devem ser consideradas
como fins em si e não como meios- se todos os seres humanos
são iguais, deve-se tratar a todos do mesmo jeito.
→ Revolução Francesa - o lema "Liberdade, Igualdade e Fraternidade"
traz um conceito de pessoa, o "cidadão", permeado por essa mesma
liberdade mencionada anteriormente e que inclui a necessidade
de que todos sejam tratados como iguais. Seres livres e iguais
que só poderiam escolher, como princípio de vida, a fraternidade.
→ Em muitos momentos, no entanto, alguns homens foram tratados
como "inferiores", apontando a fragilidade do conceito de pessoa
construído até então. Como exemplos, os vastos impérios
coloniais europeus, que dizimaram milhares de indivíduos nas colônias
da África e da Ásia; os fascismos europeus; o regime de segregação na
África do Sul; e os diversos conflitos étnicos e políticos.
Schopenhauer (1788-1860) - antes mesmo de Freud, indica que o
ser é guiado não pela razão, mas pela vontade, descrita como uma
força "cega e irracional" que o anima.
Comtemporaneidade:
Freud (1856-1939) - mudou a noção de "pessoa" ao descobrir
o inconsciente, que acrscentou à dimensão racional uma ligação
profunda com forças irracionais.
Edgar Morin (1921) - propõe que o humano seja pensado,
além de em sua dimensão racional, também em termos afetivos,
emocionais, sensíveis, mesmo loucos-ao lado do
Homo sapiens aparece o Homo demens.
Autor: Luis Martino
Revista: Filosofia N° 18/19
O advento do HOMEM-MASSA
Na decadente conjuntura da degradação cultural promovida
pelo nivelamento vulgar das qualidades humanas,
vivemos sob o jugo da "ditadura da massificação",
na qual se dilui todo destaque pessoal, todo brilho singular
As inúmeras transformações sociais a valorativas ocorridas
na modernidade oitocentista a partir da queda do ideário
aristocrático e sua substituição pela visão de mundo burguês
trouxeram consigo um projeto cultural de instauração da noção
de "igualdade" na esfera política, econômica ou social. Todavia,
o projeto moderno de estabelecimento da "igualdade" humana se
revelou uma farsa, pois nenhum ser humano manifesta qualquer
tipo de característica semelhante a outrem, e se falamos de "igualdade",
estamos certamente estabelecendo uma redução simbólica da
condição individual.
Ortega y Gasset foi um dos principais filósofos a problematizar
a questão da massificação da cultura na modernidade ocidental,
e suas diversas implicações na esfera simbólica e social da vida
humana. Ao criar o conceito de "homem-massa", o filósofo forneceu
um importante aparato intelectual para compreendermos de que
maneira vivemos sob a égide moralista do nivelamento humano,
e de que forma nossa criação cultural se submeteu a tais parâmetros
normativos motivando, assim, nada mais do que o empobrecimento
existencial e a legitimação do grotesco. Para Ortega y Gasset,
" de repente a multidão tornou-se visível, instalou-se nos lugares
preferenciais da sociedade. Antes, se existia, passava despercebida.
Ocupava o fundo do cenário social; agora, antecipou-se às baterias,
tornou-se o personagem principal. Já não há protagonistas, só coro".
É importante destacar que a configuração valorativa do "homem-massa"
não segue parâmetros sociais ou econômicos específicos,
mas a análise da existência ou não de uma nobraza de espírito interior.
Assim, uma pessoa detentora de posses materiais, caso avalie sua
existência pelos parâmetros quantitativos da ganância, da falta de finesse
e da degradação do gosto cultural, associa-se ao grupo dos "homens-massa";
por sua vez, uma pessoa desprovida de instrução formal e de bens materiais,
mas que é dotada de espírito avaliativo e sensibilidade cultural para
apreciar aquilo que é belo ou sublime, se encontra longe da esfera vulgar
da tipologia da massa, caracterizada justamente pela ausência de critérios
seletivos em suas avaliações. Para Ortega y Gasset, " massa é todo aquele
que não atribui a si mesmo um valor - bom ou mau - por razões especiais,
mas que se sente como todo "mundo" e , certamente, não se angustia com isso,
sente-se bem por ser idêntico aos demais"(in Rebelião das massas,p.45)..
Autor: Renato Nunes Bittencurt
Revista: Filosofia Ano V, No: 52
Autor: Renato Nunes Bittencurt
Revista: Filosofia Ano V, No: 52
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